Comissão da ALMG visita áreas ameaçadas por ferrovia em Igarapé e São Joaquim de Bicas e alerta para riscos socioambientais 3c3j5o

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Divulgação / ALMG

Uma visita técnica da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) reacendeu o alerta sobre os impactos ambientais, sociais e culturais que podem ser provocados pela implantação do Ramal Ferroviário Serra Azul, proposto pela empresa Cedro Participações. A atividade foi realizada nesta sexta-feira (9), a partir de requerimento da deputada Beatriz Cerqueira (PT), e contou com a participação da deputada Lohanna (PV).

Projeto ameaça nascentes, áreas protegidas e moradias

Com cerca de 32 quilômetros de extensão, o ramal cortaria os municípios de Igarapé, São Joaquim de Bicas, Mateus Leme e Itaúna, ligando-se à Malha Regional Sudeste para escoamento de até 25 milhões de toneladas de minério de ferro por ano até o Porto de Itaguaí (RJ). O traçado, no entanto, afetaria diretamente 78 cursos d’água, unidades de conservação e áreas residenciais.

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A ferrovia ameaça a segurança hídrica de parte da Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), incluindo o Sistema Serra Azul, responsável pelo abastecimento de água da capital. Pequenos produtores, ambientalistas e moradores denunciam danos já provocados pela mineração na região, como a extinção de nascentes e a diminuição do fluxo de diversos córregos.

Falta de informações

Durante a visita, representantes da Prefeitura de Igarapé e da Câmara Municipal afirmaram não terem sido oficialmente notificados sobre o projeto. Moradores relataram o sobrevoo de drones, invasão de terrenos e até envenenamento de árvores. Ao mesmo tempo, peças publicitárias do empreendimento já circulam em veículos de comunicação, exaltando benefícios como a redução do tráfego de caminhões na região.

O secretário de Meio Ambiente de Igarapé, Pedro Américo Batista de Oliveira, destacou que 64% do território municipal está em áreas de proteção e criticou a ausência de diálogo. Segundo ele, a prefeitura obteve informações do traçado diretamente com a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), que declarou a obra de utilidade pública em março deste ano, permitindo desapropriações.

Capela, hospital e hortas familiares sob risco

A visita percorreu diversas áreas que podem ser afetadas pelos trilhos. No Bairro Ouro Verde, em Igarapé, a ferrovia aria sobre o Centro de Vida Madre Clarice, fundado há 30 anos pela Irmã Graciema Terezinha Tamanho. “Esse projeto é demoníaco. Cuidar da vida e do planeta é mais importante”, declarou.

A comissão também observou que os trilhos devem ar a apenas 500 metros do Hospital 272 Joias, construído com recursos do acordo de Repararação de Brumadinho. Pequenas propriedades produtivas, como a Fazenda Tatu, onde se cultiva pitaia, estão no trajeto da obra. Moradores se reuniram para denunciar a falta de consulta e temer desapropriações forçadas.

Cursos d’água e condomínios podem ser afetados

Divulgação / ALMG

Os córregos Estiva e Mosquito e o Ribeirão Carandaí — todos importantes para o Sistema Serra Azul — estão ameaçados pelo traçado. A geóloga Daniela Cordeiro explicou que cortes e aterros para a ferrovia podem comprometer a vazão e destruir nascentes. Condomínios como Vale da Serra e Morada da Serra também podem ser diretamente atingidos.

A estimativa é de que, apenas em Igarapé, cerca de 5 mil famílias estejam na área de impacto. No Bairro Vivendas Santa Mônica, uma cachoeira pode desaparecer. O secretário Pedro Américo alertou ainda para a possível extinção do Projeto Guardião dos Igarapés, que atua na proteção hídrica há uma década.

Em São Joaquim de Bicas, Aldeia Pataxó pode perder nascentes e espaço sagrado

Divulgação / ALMG

A última parada da visita técnica foi na Aldeia Indígena Pataxó Naô Xohã, situada às margens do Rio Paraopeba, em São Joaquim de Bicas. A comunidade foi recebida com rituais de boas-vindas e reafirmou a resistência à destruição de seu território. O cacique Sucupira denunciou a proximidade do novo ramal com a terra indígena e lembrou que duas nascentes sagradas podem ser comprometidas.

“Cada árvore, cada rio, é sagrado para nós. Eu e meu povo não vamos permitir que nossa terra seja destruída. Nós vamos resistir”, afirmou o líder.

Relatório técnico vai embasar ações contra a obra

A deputada Beatriz Cerqueira anunciou que o relatório da visita será encaminhado ao Ministério Público e à ANTT. Segundo ela, as próximas etapas incluem visitas às cidades de Mateus Leme e Mário Campos, além de reuniões com a Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Semad), onde o processo de licenciamento ambiental ainda não foi protocolado.

A deputada Lohanna ressaltou que a ferrovia precisa ter seu traçado revisto, diante da diversidade e da relevância das áreas afetadas. “Essa ferrovia vai impactar quatro municípios, a reserva hídrica da RMBH e até comunidades tradicionais. Isso não pode ser ignorado”, concluiu.

*Com informações de ALMG